20.2.07
17.2.07
Os cacos de vidro
12.2.07
O gato de olhos azuis
10.2.07
Um filme sem chão
7.2.07
O genocídio diário de imagens
5.2.07
A pilastra que estava na frente da poesia
Estou cada vez mais convencido de que essa troca incessante de palavras mal-distribuídas por entre gavetas de silêncio que nossa sociedade chama de 'conversa' não é mais do que um constante cuspe de partículas de realidade. Tentamos descobrir o outro. O outro tenta se revelar. Nenhum dos dois sabe como, mas todos acham que isso é possível.
Falta apenas uma única estação. As palavras se atropelam em uma tentativa última de tentarem fazer sentido. Se o leitor quer uma imagem, pense em um quebra-cabeça infinito que tem a arrogância - ou ingenuidade, sinônimos arrogantes e ingênuos demais para se admitirem - de se imaginar completo antes de um abrir e fechar de portas. Ele fala em filmes, brisas e chineses como se estivessem interligados. Ela responde com sorrisos, valores morais e olhares de lado como se fossem coisas completamente diferentes.
A porta do metrô se abre ao som da frustração de palavras que ficaram para trás. Se deslumbres de real foram vistos, serão esquecidos pelas amnésias impostas pela grande bolsa de besteiras que é o mundo que nos obriga a lembrar de métodos para o uso de maçanetas e nos faz esquecer dos métodos de fabricação de momentos.
Ele salta de um lado para o outro da porta do metrô como se precisasse de passaporte. A porta se fecha e prende consigo meio suspiro que ficou por ali, mais inspirado do que expirado. Ele dá alguns passos adiante antes de olhar para trás querendo copiar a poesia daqueles olhares de despedida que ele deve ter visto em algum filme óbvio. Seus olhos apressados, porém, acabam trombando em uma pilastra de metal que estava ali distraída. O choque poderia ter derrubado a pilastra, e com ela, todo o chão do universo. Ao invés disso, caiu a poesia, sem fazer barulho suficiente para que alguém se importasse.
2.2.07
O circo precisa de lágrimas
Sua auto-consciência tentava transportar para ela suas coleções de angústias. Erguia em sua frente um espelho monumental, como que para nela refletir suas próprias rachaduras. Sim, sabia que o mundo não era diferente dele. Um encanamento absurdo, que vazava não se sabia aonde e aumentava diariamente a conta de água da existência. Não adiantava. A tristeza da platéia de um circo é a razão de ser do palhaço. Cria o riso como torneira da lágrima.
Frustrado, muda o tom da conversa. Pergunta sobre o estudante de direito, com quem ele achava que ela tinha terminado o namoro. Na verdade, não haviam terminado, posto que sequer haviam começado. A incerteza a maltratava, posto que não sabia se existia alguma relação. Falava isso e lembrava o outro, o artista plástico. Esse era louco, pior que o primeiro. Lhe comprava um sorvete e se dizia apaixonado, mas no dia seguinte lhe falava da ex, e que pensava em voltar. Ela agora deixava as expectativas tomarem conta de si, deixando também o dia-atrás-de-dia frustrar cada momento antes esperado com o horror do nada que acontece a cada minuto, como que em um assassinato sistemático de instantes a sangue frio. Enfim, ela se desespera ao lembrar-se de que passava exatamente pela mesma situação a dois anos atrás. Sente-se presa como que em uma gaiola de tempo, aquário das repetições eternas. Torna-se redundância. Entra em prantos.
Ela se acalma. Ele conta uma piada. O rosto, ainda molhado de lágrimas, consegue rir, apesar do desespero ainda berrado por seus olhos. Na realidade, ria por causa do desespero. Ele era o palhaço da platéia perfeita, e sabia disso.